Saúde mental no tratamento oncológico: pacientes emocionalmente amparados são mais propensos a seguir os protocolos médicos

Suporte emocional e psicológico na jornada contra o câncer é essencial para fortalecer o enfrentamento da doença e melhorar os resultados terapêuticos

Postado em 11/01/2025
Saúde mental no tratamento oncológico: pacientes emocionalmente amparados são mais propensos a seguir os protocolos médicos
Imagem: Freepik
Avatar
Por Luciana VenturaJornalista

O diagnóstico de câncer marca um divisor de águas na vida do paciente, trazendo à tona desafios físicos, emocionais e até espirituais.

Além do impacto do tratamento no corpo, a mente também é profundamente afetada, com muitos pacientes enfrentando ansiedade, depressão e medo do futuro.

Reconhecer e tratar essas questões é essencial para garantir a qualidade de vida e melhorar a resposta às terapias oncológicas.

Um estudo publicado na Frontiers revela que 25% dos pacientes com câncer apresentam sintomas de depressão, e até 45% relatam níveis elevados de ansiedade.

Esses transtornos não apenas reduzem a qualidade de vida, mas também interferem diretamente na adesão ao tratamento.

"A saúde mental não é um elemento acessório; ela é uma parte essencial do cuidado integral do paciente oncológico," ressalta Cristiane Bergerot, líder nacional da especialidade equipe multidisciplinar da Oncoclínicas.

O suporte psicológico permite ao paciente enfrentar o processo terapêutico com maior resiliência, fortalecendo a comunicação com a equipe médica e favorecendo a adesão às terapias.

Psicólogos especializados desempenham um papel crucial, ajudando a gerenciar emoções, criar estratégias de enfrentamento e até orientar familiares no suporte ao paciente.

Psicoterapia ainda é desafio no Brasil

Apesar de sua relevância comprovada na melhoria da qualidade de vida, a psicoterapia enfrenta barreiras consideráveis no Brasil, impedindo que muitos pacientes tenham acesso a esse recurso essencial.

O Índice Instituto Cactus-Atlas de Saúde Mental destaca que apenas 5,1% dos brasileiros recebem acompanhamento psicoterapêutico regular, enquanto 16,6% fazem uso de medicamentos psiquiátricos sem apoio complementar, uma prática que pode limitar a eficácia do tratamento.

A psicoterapia também enfrenta o estigma cultural, muitas vezes vista como desnecessária ou como um "luxo".

Esse preconceito, aliado à falta de informação sobre os benefícios do acompanhamento psicológico, leva muitos pacientes a desconsiderar essa opção, mesmo quando apresentam sinais claros de sofrimento emocional.

Outro entrave significativo está na baixa integração da saúde mental ao cuidado oncológico.

Faltam profissionais especializados disponíveis para atender a demanda crescente, além de uma coordenação mais eficaz entre psicólogos, oncologistas e outros profissionais da saúde para oferecer um atendimento multidisciplinar.

"Precisamos desmistificar questões como essas. O câncer não afeta apenas o corpo; ele impacta o indivíduo de forma holística, e a abordagem terapêutica deve refletir essa complexidade," acrescenta Bergerot.

Corpo, mente e espírito: a espiritualidade no cuidado oncológico

A espiritualidade surge como um componente indispensável no enfrentamento do câncer, complementando abordagens terapêuticas e psicológicas.

Segundo Clarissa Mathias, a espiritualidade tem o poder de ressignificar a experiência do paciente, oferecendo conforto, equilíbrio e propósito mesmo nos momentos mais desafiadores.

"Ela permite ao paciente encontrar forças internas para lidar com a jornada, promovendo bem-estar e serenidade em meio às adversidades", destaca Clarissa Mathias, oncologista da Oncoclínicas.

Diferente da religiosidade, que envolve dogmas e práticas específicas de uma fé, a espiritualidade pode ser vivenciada de diversas formas, como por meio da meditação, do contato com a natureza ou de reflexões pessoais.

Essas práticas auxiliam na redução do estresse e contribuem para uma visão mais ampla e integrada da saúde mental, conectando corpo, mente e espírito.

No entanto, integrar a espiritualidade à prática médica ainda enfrenta obstáculos significativos.

Falta de capacitação dos profissionais, tempo restrito nas consultas e o receio de impor crenças pessoais ao paciente são algumas das barreiras apontadas.

"A medicina contemporânea precisa enxergar o paciente em sua totalidade, compreendendo que o cuidado vai além do biológico e inclui aspectos emocionais e espirituais. Essa abordagem mais humanizada é essencial para oferecer suporte completo," afirma a oncologista.

Iniciativas que promovem a espiritualidade como parte do cuidado oncológico têm mostrado impactos positivos, reforçando que a saúde integral não se limita ao físico, mas inclui a dimensão emocional e espiritual.

Essa visão holística está alinhada com a busca por práticas mais humanizadas na medicina e no acompanhamento de pacientes oncológicos.

Benefícios do acompanhamento psicológico

- Adesão ao tratamento: pacientes emocionalmente amparados são mais propensos a seguir os protocolos médicos;

- Redução do estresse: técnicas como mindfulness e terapia cognitivo-comportamental ajudam a equilibrar as emoções;

- Fortalecimento da rede de apoio: psicólogos podem orientar familiares a prestar suporte de maneira mais eficaz;

- Melhora na qualidade de vida: reduzir os sintomas de depressão e ansiedade proporciona mais momentos de bem-estar durante a jornada oncológica;

Caminhos para melhorar o cenário

Garantir uma abordagem integral no cuidado oncológico, que contemple saúde mental e espiritualidade, exige uma série de transformações estruturais e culturais.

Entre os passos mais urgentes estão o fortalecimento de políticas públicas, o investimento em educação profissional e a ampliação do acesso a serviços especializados de saúde mental e espiritualidade.

Políticas públicas robustas e financiamento adequado

O fortalecimento de políticas públicas de saúde mental é fundamental para garantir o acesso a terapias psicológicas e cuidados integrativos no contexto oncológico.

Isso inclui financiamento direcionado para a contratação de psicólogos especializados, além da inclusão de práticas integrativas e complementares.

Educação e capacitação de profissionais de saúde

A formação dos profissionais da área médica deve ser revisada para incluir competências sobre saúde mental e espiritualidade, promovendo uma visão mais humanizada do cuidado.

Cursos e treinamentos poderiam abordar técnicas de abordagem emocional, como anamnese espiritual e comunicação empática.

Essa formação ajudaria médicos, enfermeiros e psicólogos a oferecer um suporte mais completo, reduzindo barreiras de tempo e desconhecimento.

Campanhas de conscientização pública

Campanhas voltadas ao público geral têm papel estratégico na desmistificação da psicoterapia e no incentivo ao cuidado integral.

Essas iniciativas poderiam abordar temas como o impacto da saúde mental na adesão ao tratamento oncológico e o papel da espiritualidade no enfrentamento da doença, promovendo maior aceitação e busca ativa por suporte.

Integração entre suporte psicológico e espiritual

Modelos de atendimento integrativo, que aliam psicoterapia a abordagens de espiritualidade, têm mostrado resultados promissores.

Parcerias com comunidades religiosas ou organizações que oferecem apoio espiritual podem criar redes de suporte mais amplas e acessíveis.

Além disso, tecnologias como aplicativos de meditação e plataformas de suporte emocional podem ser ferramentas viáveis para complementar o atendimento presencial.

Pesquisa e inovação

Investir em pesquisas sobre os impactos da saúde mental e da espiritualidade no tratamento oncológico é crucial para embasar políticas e práticas clínicas.

Estudos que avaliem a eficácia de abordagens integrativas, como terapias baseadas em mindfulness e grupos de apoio espiritual, podem reforçar sua inclusão no cuidado padrão.

"A verdadeira luta contra o câncer vai além da doença; é uma jornada pela dignidade, pelo equilíbrio e pelo bem-estar do paciente. Precisamos de uma medicina que enxerga o ser humano em sua complexidade, unindo corpo, mente e espírito para alcançar melhores resultados terapêuticos," conclui Cristiane Bergerot.

 

Fonte: Digital Trix Comunicação

Mais sobre Brasil